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Botafogo 2025: A Temporada de um "One-Hit Wonder" e as Lições de Textor e Ancelotti
Por Redação FutFogão em 23/12/2025 08:24
O calendário de 2025 para o Botafogo, ao ser revisitado, revela uma narrativa que ecoa a expressão "one-hit wonder". No universo musical, tal termo descreve artistas que atingem um sucesso estrondoso com uma única canção, mas falham em replicar o mesmo impacto ou qualidade em produções subsequentes. Assim como o Extreme é frequentemente lembrado apenas por "More Than Words", ou o Survivor por "Eye of the Tiger", o Glorioso, em 2025, parece ter tido seu momento de brilho singular. Este ápice foi alcançado na vitória por 1 a 0 sobre o Paris Saint-Germain, em 20 de junho, no Rose Bowl Stadium, em Los Angeles, durante a segunda rodada do Super Mundial de Clubes da Fifa.
Aquele confronto contra os franceses foi um capítulo à parte na história recente do clube. Renato Paiva, então comandante técnico, conhecido por suas declarações incisivas, proferiu antes da partida uma frase que se tornaria profética: "O cemitério do futebol está cheio de favoritos". No dia seguinte, a equipe alvinegra entregou uma performance que beirou a perfeição tática e emocional. Com uma dedicação notável, nove jogadores cercaram os adversários, defendendo a meta botafoguense de forma comovente. Foi em um contragolpe fulminante que Igor Jesus, vestindo a camisa 99, balançou as redes, desmantelando as expectativas do mundo do futebol. A imagem do atacante com os braços abertos, após derrubar o então campeão europeu, permanece eternizada como a maior vitória do futebol brasileiro neste século.
O impacto desse triunfo ressoou globalmente, reafirmando a magnitude do Botafogo e garantindo sua permanência no "Grupo da Morte" do torneio. Contudo, a equipe não conseguiu sustentar o momentum. A jornada gloriosa teve um ponto final abrupto na derrota por 1 a 0 para o Palmeiras, na prorrogação, um resultado que selou o destino de Paiva no comando do Mais Tradicional. John Textor, o líder da SAF, expressou sua insatisfação ao observar o time adotar uma postura excessivamente reativa contra um adversário de igual envergadura. A decisão foi rápida: o técnico português foi dispensado, e Davide Ancelotti, filho do renomado Carlo Ancelotti, então na Seleção Brasileira, foi convocado para assumir o posto.
O Caminho Turbulento: Títulos Perdidos e Mudanças no Elenco
A temporada de 2025 já havia começado sob um signo de incerteza. Após as conquistas da Libertadores e do Brasileirão em 2024, o Botafogo se reapresentou em janeiro sem um treinador definido, uma situação que se arrastava desde dezembro. Artur Jorge, o arquiteto dos sucessos anteriores, havia cedido aos encantos financeiros do Al-Rayyan, do Catar, em uma jogada que, para muitos, o consagrou como um dos maiores da história do clube, ao mesmo tempo em que o eximia dos riscos de uma segunda temporada menos brilhante. Sua saída deixou um vácuo e muitos torcedores desamparados.
Paralelamente à busca por um novo técnico, o elenco sofreu alterações significativas. Jogadores importantes para as campanhas vitoriosas, como Gatito, Tchê Tchê, Eduardo, Romero, Júnior Santos e Tiquinho, foram negociados. As estrelas Almada e Luiz Henrique também deixaram General Severiano. Em contrapartida, chegaram Linck, Jair, David Ricardo, Artur e Santi, além de outros nomes que não conseguiram se firmar, como Rwan, Nathan e Elias. A instabilidade se refletia não apenas no banco de reservas, mas também na composição do time.
Enquanto a diretoria se empenhava em encontrar um novo comandante, o Botafogo conduziu o Campeonato Carioca de forma protocolar. Embora os Estaduais sejam frequentemente vistos como torneios de menor relevância, a "ressaca" inicial do Glorioso custou caro. A equipe não conseguiu apresentar um desempenho competitivo na Supercopa do Brasil, sendo superada por um rival do Rio de Janeiro em Belém do Pará. No mês seguinte, a humilhação foi ainda maior: a Recopa foi perdida de forma contundente para o Racing, com os jogadores argentinos celebrando a vitória no Estádio Nilton Santos com danças de cumbia. Dois troféus inéditos, que poderiam ter trazido estabilidade ao clube, foram desperdiçados sob o comando dos interinos Carlos Leiria e Cláudio Caçapa.
A Gestão Paiva e as Disputas nos Bastidores
Exausto da prolongada indefinição sobre o comando técnico, John Textor anunciou Renato Paiva no dia seguinte aos fiascos. A escolha, no entanto, gerou considerável resistência entre a torcida. Com as taças da Libertadores e do Brasileirão ainda em mente, o Godfather minimizou os contratempos do início do ano, lançando um desafio audacioso aos adversários: "Come and get us" (venham nos pegar). Em meio à efervescência do Carnaval carioca, o empresário celebrou, enquanto o elenco iniciava um mês de preparação para o Campeonato Brasileiro e a fase de grupos da Copa Libertadores, marcando abril como o verdadeiro início da temporada.
Um dos desafios de Renato Paiva era reabilitar sua imagem após uma passagem conturbada pelo Bahia, marcada por um incidente com um jornalista local. Nesse aspecto, ele obteve sucesso, transmitindo serenidade e demonstrando impecável trato com a imprensa. Contudo, a cordialidade não seria suficiente para sustentar seu trabalho. Paiva rapidamente identificou uma dualidade na equipe alvinegra: a incapacidade de replicar, fora do Estádio Nilton Santos, o mesmo padrão de desempenho exibido em casa. Gradualmente, porém, o time começou a conquistar vitórias como visitante, enquanto em seus domínios, exibia uma força avassaladora. O português alcançou um aproveitamento de 92,5% em casa, um número que foi crucial para a classificação às oitavas de final da Libertadores e da Copa do Brasil, além de colocar o clube no G6 do Brasileirão antes da viagem aos Estados Unidos.
Apesar dos méritos, Paiva cometeu erros antes de sua demissão em julho. O mais notório foi a insistência no volante De Paula, que retornava de empréstimo do Criciúma. O treinador nutria a esperança de reaver o jogador promissor que havia se destacado no passado pelo Palmeiras. De Paula chegou a atuar como "camisa 10", mas desapareceu em confrontos importantes, perdendo espaço na equipe. Outro que não correspondeu às expectativas foi o centroavante Mastriani, que não conseguiu ser o substituto à altura de Igor Jesus , ficando aquém de suas performances anteriores por América-MG e Athletico-PR. Durante a gestão Paiva, o Botafogo também anunciou as contratações de Pantaleão, Montoro, Tucu e Cabral, todos utilizados na campanha americana.
Conflitos Corporativos e a Era Ancelottinho
O segundo semestre de 2025 foi amplamente dominado por intensas disputas judiciais envolvendo o Botafogo . A Eagle Football, detentora de 90% do futebol alvinegro e também proprietária do Lyon, iniciou um processo legal para destituir John Textor das decisões da SAF. Essa movimentação ecoou a forma como a holding havia forçado o empresário a renunciar ao clube francês, em meio a uma grave crise financeira e risco de rebaixamento. Embora Textor fosse o sócio majoritário da Eagle, ele se encontrava em litígio com seus pares acionistas. Contudo, o empresário norte-americano conseguiu, por meio de uma decisão judicial contestada pela empresa, manter o poder no Mais Tradicional. Entre acusações nos tribunais, dívidas com o fundo Ares pela aquisição do Lyon e os habituais vazamentos de áudios, o bilionário alvinegro adotou um discurso conciliador, classificando os desentendimentos com a Eagle como "brigas de família" e indicando que um acordo estava próximo. "It's only business", argumentava o magnata da ensolarada Flórida.
A Eagle Football, no entanto, não demonstrou interesse em uma trégua. Em outubro, a holding sustentou que Textor e a SAF/Botafogo empregaram "táticas de guerrilha", dificultando a criação de um Tribunal Arbitral para resolver o impasse e criando um "senso ilusório da realidade". A empresa expressou preocupação de que, com Textor no comando do Glorioso, haveria a possibilidade de o empresário ter autonomia para realizar conclaves irregulares e contratações ilícitas. Em resposta, o Godfather reformulou o conselho de administração da companhia, rompeu com antigos sócios e manifestou a intenção de manter o Alvinegro na Eagle, sem a necessidade de recomprar o futebol do clube.
A paz, contudo, ainda era um horizonte distante. Em novembro, o associativo, antigo aliado de Textor, solicitou uma intervenção judicial no futebol do Botafogo , além da proibição da venda de ativos, como jogadores. Posteriormente, a ação foi retirada. A SAF, por sua vez, não hesitou em responder, ponderando que os pleitos na Justiça eram "baseados em alegações inverídicas, sem amparo jurídico, sem fundamento no contrato de investimento ou no acordo de acionistas". O ambiente em General Severiano permaneceu tenso, com um intrincado xadrez de conflitos se desenrolando nos bastidores.
Resultados Esportivos: Eliminações e a Vaga na Libertadores
Retornando ao campo de jogo, Davide Ancelotti assumiu o cargo de treinador do Botafogo em julho, sucedendo Renato Paiva. Aos 35 anos, Ancelottinho iniciava sua carreira em um gigante do futebol mundial, munido da experiência de ter acompanhado o pai, Carlo Ancelotti, como auxiliar técnico no Bayern de Munique, Napoli, Everton, Real Madrid e em uma partida pela Seleção Brasileira. Naquele momento, o departamento de futebol e a nova comissão técnica empreenderam uma reformulação do elenco em plena metade da temporada. Gregore seguiu para o clube de Artur Jorge, no Catar. John , Jesus, Cuiabano e Jair reforçaram o Nottingham Forest, beneficiados pela proximidade entre Textor e o grego Evangelos Marinakis, proprietário do clube inglês.
Em contrapartida, o Forest cedeu Danilo, ex-Palmeiras, ao Fogão e concordou em emprestar Cuiabano . O Botafogo também investiu na aquisição do jovem colombiano Barrera, do imponente Neto e do corpulento Ramos. Apesar dos reforços e da permanência de jogadores de 2024, a equipe de Ancelottinho não conseguiu avançar nas competições de copa. Na Libertadores, foi superada pela LDU, na altitude de Quito, nas oitavas de final, com um placar agregado de 1 a 2, de virada. Na Copa do Brasil, após eliminar o Bragantino e chegar às quartas, foi derrotada nos pênaltis pelo Vasco, após um empate em 2 a 2 na série. Em setembro, a percepção de muitos torcedores era de que a temporada de 2025 já estava comprometida. No Campeonato Brasileiro, a equipe se distanciou da disputa pelo título, encerrando um ano sem conquistas.
O Botafogo , no entanto, conseguiu assegurar a vaga na Libertadores de 2026, um objetivo alcançado com sucesso a três rodadas do fim do Brasileirão, e um dos méritos no contestado trabalho de Ancelottinho. Apesar das críticas e das ironias, o jovem treinador europeu também encerrou sua passagem com uma notável sequência de dez partidas de invencibilidade. Contudo, sua permanência no Mais Tradicional não se concretizou. Luca Guerra, preparador físico, estava prestes a ser desligado. Apelidado pela torcida de "Açougueiro do Lonier", o italiano teve seu trabalho questionado pela diretoria devido ao número incomumente elevado de lesões. Entre a lealdade ao amigo e o vínculo com o clube, Davide optou pela primeira, proferindo um "arrivederci" aos alvinegros.
Marçal: A Constância em Meio à Turbulência
Na análise individual do elenco , Marçal merece um capítulo à parte. Aos 36 anos, o lateral-esquerdo demonstrou uma resiliência e qualidade que o fazem parecer um "vinho devidamente conservado em uma adega climatizada", especialmente considerando o clima do Rio de Janeiro. Quanto mais o tempo passava, melhor seu desempenho. Nesta temporada, Marçal foi um pilar fundamental, suprindo as ausências na zaga, que sofreu com as graves lesões de Pantaleão e Bastos. O camisa 21 assumiu a posição com autoridade, fechando a defesa, marcando gols e vivendo uma fase artilheira. Foi o único jogador que, à exceção da partida contra o PSG, recebeu a nota máxima do Jogada10 em suas atuações.
Multicampeão em 2024, Marçal já havia sinalizado o fim de sua jornada no Botafogo . No entanto, após receber uma ligação de John Textor, acertou seu retorno até dezembro de 2025. De um plano C, o experiente defensor ascendeu ao protagonismo no elenco . Agora, possui argumentos sólidos para negociar sua renovação. Tendo ficado apenas quatro meses afastado, não é exagero considerá-lo um dos jogadores mais longevos do Glorioso, tendo chegado em 2022, no primeiro ano da SAF, quando o clube ainda almejava voos maiores. Sem dúvida, o futuro o colocará no mesmo patamar de ídolos como Freitas, Barboza e Telles. 2025 foi, inegavelmente, o ano de Marçal .
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